sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Consumado e consumido






Era madrugada, acordei novamente com o cheiro forte de carne assada passando pelas minhas narinas, levantei-me sem que Celine percebesse e fui lavar o rosto. Quando abri a torneira e pus as mãos embaixo da água corrente da torneira comecei a sentir uma dor lancinante que de longe se comparava com a dor que senti na noite anterior, a dor era tanta que não aguentei e sentei ali mesmo no chão do banheiro, enquanto estava sentado comecei a ouvir novamente os rugidos em minha mente como se estivessem em um tenebroso embate e a cada golpe entre eles era o meu corpo que na verdade era golpeado.
E enquanto sentia aquela dor insuportável me recordava do ritual da noite anterior, meu espanto e ao mesmo tempo extâse que consumia meu corpo com cada palavra invocada, cada gesto realizado, cada treva e cada chama que me envolvia, lembro da dor que senti quando senti as trevas trespassando meu corpo, era uma dor semelhante ao corte com uma lâmina mas ao mesmo tempo era totalmente diferente como se essa lâmina ao tocar minha pele se multiplicasse e penetrasse meu corpo inteiro, aquelas trevas que me proporcionavam inúmeras e diferentes sensações, eram como se meus sentidos estivessem totalmente perturbados como uma bússola que ficasse totalmente sem rumo, era assim que me sentia, mas nada compara-se às chamas, que ao entrar em contato com meu corpo queimavam-me, eu sentia-me como um papel queimando, minha carne queimava, e quanto mais achava que não iria suportar aquilo, as vozes em forma de rugido me obrigavam a suportar, mostrando-me imagens de outros que como eu tentavam controlá-los, mas sabia que não podia desistir, na verdade eu não queria desistir, tinha ido muito longe pra recuar, a dor que estava sentindo não seria nada em relação à lembrança de ter tentado e falhado, pensava em todo o caminho percorrido, tudo que sofri nos treinamentos com Cassius e com Celine, sim Celine, não poderia deixá-la agora que enfim estava conseguindo me aproximar dela, pra mim seria uma grande perda de tempo ter chegado ali e não conseguir, e mesmo sentindo a cada segundo minhas forças indo embora e eu tentando ao máximo possivel suportar tudo aquilo, em um determinado momento cheguei a realmente desistir, deixei meu corpo esmorecer, ser consumido totalmente pelas chamas e pelas trevas ali presentes que bailavam em minha volta como se estivesse participando de um espetáculo de balé ou outra coisa, quando por fim já tinha dado-me por vencido, eis que escuto ambos em forma de rugido grintando:
- Humano, se  quiserdes nos controlar terás que provar teu valor, terá que provar que a dor, o cansaço e até mesmo a própria morte são todos sacrificios mínimos se comparados à dádiva de servir a qualquer elemento, tornar-se um com qualquer caminho da magia, poder invocar-nos, poder ser uno conosco.
Ao ouvir aquilo algo em mim dava-me força e pude então não mais sentir nada e dali em diante meu corpo que antes lutava contra eles passou a consumi-los e ao fim de tudo lembro-me de Cassius dizer uma única frase:
- Pronto, nosso trabalho inicial foi concluído, está enfim consumado meu caro
E olhando para mim disse:
- Hans está consumado meu caro, agora prepare-se para o que lhe aguarda, descanse criança, mas não esqueça nunca que tudo tem seu preço e que um dia ele será cobrado.
E depois de longos minutos ou não sei se horas lembrando, acordei do meu delírio ou melhor transe se é que podemos dizer isso, com a voz de Celine chamando-me.
E enquanto sua voz ecoava em meus ouvidos, minha mente produzia uma série de imagens e uma única afirmação que tudo foi consumado e consumido por mim e em mim.        

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