terça-feira, 30 de abril de 2013

Infância






São três horas da manhã, estou sem sono, levanto-me do sofá e sigo até a estante de onde retiro um álbum com fotografias de infância, lembranças de tempos bons, tempos nos quais não tinha nenhum tipo de preocupação, tempos onde o importante era viver e não ter que tentar sobreviver mais um dia, tínhamos a escolha de aproveitar o dia ou não, de poder ver o pôr do sol, tomar banho no lago, andar na chuva, enfim de sermos normais. Tempos que viviamos e agíamos como crianças que éramos e que gostávamos de ser, apesar de toda a carga de responsabilidade que nos começava a ser imposta ainda nos era permitido sentir a idade avançar no caminho adequado.
Agora caminho em direção à geladeira, apanho uma cerveja, abro-a e brindo em homenagem a Hendrick, afinal faz duas semanas que morreu, olho agora as fotos e sinto-me consumido não somente pela tristeza de não o ter mais aqui, apesar que nos últimos tempos mal tinhamos contato, mas por ver nas imagens tempos em que a importância primeira era apenas aproveitar cada instante do dia como um suposto CARPE DIEM, não que esse fosse o nosso caso, mas pensávamos em aproveitar tudo aquilo que em algum momento sabíamos que não passariam apenas de memórias para alguns de nós, uma "família" ligada nas diferenças, distantes nos sentimentos, ligados apenas por habilidades e circunstâncias em comum.
De todas as lembranças de nossa infância a que gosto mais de lembrar são aquelas que são as mais verdadeiras, aqueles momentos onde não é preciso uma única palavra sequer para que os outros tenham noção do que se quer dizer, não precisar reclamar de algo,pois, logo saberá o que tornou-se incômodo, não ter nada em mente a não ser brincar e ser algo que a cada dia deixamos de ver, crianças, vejo na rua não mais crianças como as de outrora, mas seres adultos não formados.
Agora não sei se o sono está ficando maior ou o efeito das cervejas em um estômago vazio, deixa pra lá, hora de apagar as luzes, horizontalizar o corpo e esperar por mais um dia de vida ou morte.  

terça-feira, 23 de abril de 2013

Persona non grata


Era por volta de três horas da tarde quando desembarquei no aeroporto em Munique, ao chegar percebi prontamente que Bergkans e Hilda estavam me esperando, fui em direção deles que em seguida perguntaram praticamente em coro:
E ai onde ele está? Está vivo?
Eu olhei-os de forma que meu semblante traduzia bem minha resposta. Hilda olhando fixamente pra mim começou a me inquirir para saber como se deu a morte de Hendrick. Eu comecei a contar tudo o que descobri ao chegar no Brasil. Passadas algumas horas voltamos para a casa de nosso pai e lá chegando fomos tratar dos preparativos para o funeral ou ao menos uma cerimônia de corpo presente, já que não existia corpo para ser velado.
Depois de algumas horas preparativos concluidos, amigos e familiares presentes, tudo corria na maior tranquilidade, tudo como o esperado até o momento que o silêncio do momento e som do soluçar das mulheres foi quebrado por gritos que vinham da entrada da capela. Uma mulher armada adentrou a capela gritando loucamente:
Seu maldito, mentiroso, disse que iria voltar para mim, ia me proteger e iria proteger Clara. Cadê você agora? Me diga!!!!!
Depois de gritar e chorar convulsivamente ela deitou-se abraçada com o porta-retrato de Hendrick. Hilda fez menção de ir até a mulher e tomar satisfação com ela, quem ela pensava que era para ir atrapalhar o funeral, o último momento de estar ao menos ao som do nome de nosso irmão. Ao caminhar em direção da mulher pronta para usar de força bruta se necessário, ela simplesmente ficou atônita ao ver no braço dela o terço que ele usava e próximo uma tatuagem em formato de coração com os nomes Hendrick e Verbena, mas o mais estranho da tatuagem era que não era feita com tinta, mas com ferro quente. Enquanto Hilda olhava para Verbena consternada ao mesmo tempo que revoltada ao saber que aquela mulher que estava ali chorando no chão inúmeras vezes quase matou aquele por quem chora copiosamente. Ao ver o incômodo que aquela mulher estava causando nosso pai levantou-se do banco no qual estava sentado e dirigiu-se em direção de Verbena e ao aproximar-se dela disse com um tom áspero e ao mesmo tempo compreensivo:
Qual o seu nome menina e o que você era dele?
Ela olhando-o respondeu:
- Meu nome é Verbena e ele era meu marido, ou melhor meu companheiro.
Hilda ao escutar isso falou em seguida:
Então você é a caçadorazinha com quem ele dormia? O que ainda faz aqui? Você não passa de uma persona non grata neste ambiente.
Hans olhando para Hilda e fala agora com um tom mais áspero dizendo:
Silêncio! O que aconteceu com eles não nos interessa e se ela é uma persona non grata como você diz Hilda quem decide sou eu e agora deixe-a despedir-se dele, pelo que fala ela tem tanto direito quanto nós.
Verbena olhando novamente para Hans agradece-o e em seguida diz:
Obrigado por deixar, por mais que não acreditem e por mais estranho que seja eu o amava, do nosso modo, ele foi a minha vida, a luz de minha escuridão.
E ao terminar de falar ela entrou em uma espécie de transe e ali ficou chorando abraçada com o retrado de Hendrick, era chegada a hora de encerrar o funeral e Bergkans tentou retirar dos braços de Verbena o retrato, mas ao tentar ela acabou cortando-o com uma adaga, ele no momento irritou-se e já estava pronto para acertá-la quando eu por fim resolvi intervir, retirando-a dali.        

sábado, 20 de abril de 2013

Triste partida



Cheguei agora no endereço que me foi repassado por Bergkans, descendo do táxi andando até a porteira do sitio, paro um pedaço e chamo, enquanto espero que venham receber-me sinto um frio na espinha como uma certeza do que suspeitava, que Hendrick já não estaria neste plano, alguns minutos depois confirmo minhas suspeitas assim como acabo por assustar-me ao ver quem aproximava-se para me atender. Tratava-se da maga que conheci há algum tempo atrás em Londres, Evellyn Gray e estava acompanhada com um ser de aparência digamos que levemente mórbida, no momento isso é algo que não possui relevância alguma comentar.
Quando ela aproximou-se do portão seu acompanhante já estava praticamente com uma postura ofensiva,ela então caminhando em minha direção perguntou-me quem eu era e o que queria. Eu então somente depois que acalmei-me da euforia da esperança de alguma informação positiva sobre o paradeiro de Hendrick pude enfim falar:
- Olá novamente senhorita Gray, há tempos que não a via, eu vim aqui para saber do paradeiro de uma pessoa, um membro de seu grupo.
Ela meio sem entender pergunta de quem se trata e eu novamente respondo:
- Trata-se como disse de um membro de seu grupo, seu nome é Hendrick Von Hagen. Estou preocupado com seu paradeiro, pois, fazem algumas semanas que não tenho noticias suas.
Ela então olhando para mim com uma cara forte ao mesmo tempo triste disse com um tom de voz fúnebre:
Sinto muito em dizer mas ele foi abatido durante uma passagem pelo Maranhão. Sinceramente sinto muito.
Eu fiquei destruído com aquela informação tudo que me restava naquele momento era um resquicio de sarcasmo para não entregar meu profundo abalo por sua morte eu olhando para os dois disse em seguida de uma gargalhada:
- Não acredito que ele foi para o saco, estão falando sério mesmo? Isso procede produção? 
Ao terminar de falar percebi que ela estava com uma cara de assombro, virei-me em direção do carro que estava me esperando quando ela disse:
Oi para onde você está indo? Tem local para ficar?
Eu então respondi:
- Estou voltando para preparar o funeral dele, vim somente para me certificar sobre o que de alguma forma já tinha a certeza.
Ela olhando novamente para mim, disse:
Conheci um pouco de seus dotes mágicos quando nos conhecemos lá em Londres, será que não queria nos ajudar?
Eu olhando para ela novamente em seguida para aquele que a acompanhava disse:
- É algo a ser pensado, porém, não agora, no momento preciso preparar o ritual de passagem de Hendrick e também vejo que sua companhia está apressada, então até outro dia.
Depois de nossa tecnicamente breve conversa, pois, não passaram mais de 30 a 40 minutos, desloquei-me novamente para o aeroporto e ao embarcar no avião não pude conter minha tristeza, chorei copiosamente, não por ele ter morrido, mas, por não estar presente para evitar. A viagem foi relativamente tranquila, agora estou desembarcando. Ligo para Bergkans, o telefone cansa de tanto tocar, como se ele próprio já soubesse aquilo que não queria-se saber.
Então é com tristeza que escrevo aqui neste dia 10 de novembro de 2009, agora o relógio marca que são 18:59 hrs. Noticio para mim mesmo e para quem depois ler este diário que hoje foi confirmado a triste noticia que Hendrick Von Hagen, tombou provavelmente em campo de batalha. Restando agora somente sua lembrança.